DIOGO DE SÁ
- II
Há
quem afirme que António de Sá – que, segundo Castanheda, era de Santarém - era irmão de Diogo de Sá, baseando-se em Faria
Y Sousa, que, no tomo primeiro da sua “ ASIA “, escreve : “ Ocasion fue
esta en que mostraron ilustre valor Don Vasco, y Jorge, y Fernando, y Miguel de
Lima; Leonel, y Ruy de Melo: y Antonio, y Diego de Sá hermanos”( Asia
Portuguesa, Tomo I,
Lisboa, Henrique
Valente de Oliveira,1666, pág.234). Faria Y Sousa transcreveu erradamente a
passagem acima citada da Década Terceira de João de Barros. Não é Diogo de Sá
que é irmão de António de Sá, é Rui de Mello, como, aliás, Faria y Sousa refere
noutras situações, e resulta das transcrições acima feitas,
quer de João de
Barros, quer de Fernão Lopes de Castanheda. Mas, para que não
restem dúvidas de interpretação do
citado texto de João de Barros, transcreve-se da mesma Década o que se segue : “ Dom João
neste tempo tinha repartido a guarda da fortaleza em estancias, de que estes
erão as principaes pessoas, dom Vasco de Lima, Jorge de Lima, Rui de Mello,
Antonio de Sá seu irmão, João Rabello feitor, Duarte de Faria & Antonio de
Serpa..”( ob. cit. fól.239). O Rui de
Mello, em Setembro de 1558, vivia em Cananor, casado com uma filha deDuarte
Barbosa e o António de Sá, em 1559, ainda era capitão de uma galeota ( Diogo do
Couto, Decada Setima da Asia, Pedro Crasbeeck,1616, fól.102 e
106,respectivamente).
Simão Botelho, vedor da Fazenda da
Índia, em carta a D. João III, datada de Baçaim, de 24 de Dezembro de 1548,
escreve que “ este Antonio de Sá é filho de um clérigo do Porto e de uma
freira, e matou já um homem à traição, e há poucos dias que matou aqui um negro
da terra, sem se fazer justiça dele, e
vive nesta terra
à sua vontade com uma aldeia que lhe aforou António Rodrigues de Gamboa por
duzentos pardaus, e ela rende perto de mil pardaus: escrevo isto a Vossa Alteza
para que saiba os trabalhos com que o servem nestas partes seus oficiais”( Textos
sobre o Estado da Índia, Publicações Alfa, pág.42) .
Gaspar Correia alude a duas pessoas com o
nome de António de Sá : “ Estando n’estas cousas , n’esta noyte
entraraõ dous catures que de Baçaim
mandou Gracia de Sá: em hum Antonio de Sá, o Rume d’alcunha; e no outro Antonio
de Sá, ambos sobrinhos de Gracia de Sá”.
( obr. cit. Tomo IV,parte I, pág.51). Um deles é filho de Francisco de Sá e
morre em consequência dos ferimentos sofridos no cerco de Diu ( Segundo Cerco
de Diu, obra publicada e prefaciada por António Baião, 1927,pág. 100). O que
tem alcunha de rume será o que em 1559
ainda era vivo, segundo Diogo do Couto e será o que vem referido na carta
citada de Simão Botelho e terá sido “filho de um clérigo do Porto e de uma
freira”? O que significaria que, ou
clérigo ou a freira, um deles era irmão do capitão Francisco de Sá e de Garcia
de Sá - que depois foi governador da
Índia 1548-1549 -, que são filhos do acima referido “ segundo “ João Rodrigues
de Sá (João de Barros.,Década Terceira, Jorge Rodriguez,1628, fól. 53). Sendo
Fernão Eanes de Soutomaior o capitão de Cananor, os cronistas,
assim como referem que Diogo Reinoso,
Francisco Reinoso e Antonio de Souto
Maior são filhos daquele capitão, também diriam que
António de Sá, conhecido pelo rume, também era seu filho, o que não acontece. O
mesmo se passa com o Diogo de Soutomaior, que escapa ileso no cerco de Diu e
que em1550 ainda se encontrava em terras do Oriente, como acima se demonstrou.
Por isso, não devem restar dúvidas de que o Diogo de Sá, que andou pelo
Oriente, entre 1515 e 1527, não é filho de Fernão ou Fernando Eanes de
Soutomayor, nem é o mencionado Diogo de Soutomayor do segundo cerco de Diu.
João
Paulo Oliveira e Costa escreve que “ os irmãos António de Sá ( o Rume),
Henrique de Sá e Rui de Melo eram filhos de Gomes de Sá e de Teresa de Lima (
Mare Nostrum, Temas e Debates,2013,pág. 456) . Assim sendo, o António de Sá, de
que fala Simão Botelho na sua carta, não pode ser o António de Sá ( o Rume)
cujo filho, Henrique de Sá, foi capitão das Molucas ( 1562-1564).
Já agora
acrescenta-se que, para além daqueles três filhos, Diogo de Reynoso, Francisco
de Reynoso e António de Soutomayor, Fernando Eanes de Soutomayor teve, pelo
menos, mais um, com o nome de Luis de Sottomayor, que foi frade dominicano,
lente de Sagrada Escritura em Coimbra e delegado ao concílio de Trento,
falecido em 1610. O qual nascera em Lisboa, em 1526, filho daquele capitão de
Cananor e de Mayor Diaz de Aguiar, filha de André Diaz de Aguiar Botafogo,
Adail de Tânger, e neto de Gomes Ferreira, porteiro mor de D. João II e de D.
Manuel, casado com D. Mayor de Sottomayor, filha de D. Pedro Alvares de
Sottomayor, conde de Caminha ( Barbosa Machado, Biblioteca Lusitana, Vol. III,
pág.139).
António Pais - autor da carta
inserta na obra “ De Primogenitura”, impressa em Paris em 1551, acima
transcrita - refere que Diogo de Sá era um cavaleiro verdadeiramente nobre,
oriundo da uma antiga e nobre família, e que a sua fama de matemático, teólogo
e jurista tinha precedido a sua pessoa. E acrescenta “ com os teus livros agora
publicados facilmente poderei demonstrá-lo- haec enim ex tuis libris in lucem
editis de te coniicere poteram” .Daqui é legítimo inferir que a sua formação
académica
foi adquirida antes de 1549, data da
publicação da primeira obra. E a mesma conclusão ressalta do que a seguir se
transcreve : “ Na ordem dos Mathematicos estão o Sabio Pedro Nunes, Diogo de
Sá, Francisco de Mello, e Fr. Lucas de quem faz esta memoria em sua
Arithemetica Gaspar Nicoláo,fol.LIV da terceira impressão em 1551” ( Francisco
Leitão Ferreira, Notícias Chronologicas da Universidade de Coimbra, Segunda
Parte, Vol. I, Coimbra,1938, pág.368). No entanto, não é conhecido qualquer
documento que demonstre, sem margem para dúvidas, a sua passagem por qualquer
estabelecimento de ensino, tanto em Portugal como no estrangeiro. O que não
significa que o não tenha feito. Fê-lo, com toda a certeza, mas depois de ter
regressado do Oriente.
Se em 1517, é
tratado por moço de câmara do rei, é legítimo concluir que Diogo de Sá deve ter
nascido nos primeiros anos de quinhentos, embora desconheçamos o ano e os seus
progenitores. Quanto a estes, o autor da mencionada carta di-lo oriundo de uma
nobre e antiga família. O que é confirmado por António Caetano de Sousa, quando
escreve: “ A Varonia desta Casa he Sá , antiga neste Reyno… Delle achamos
muitos fidalgos mais antigos, que Payo de Sá, que viveo pelos annos de 1300,
reynando D. Diniz: porem nelle começaõ os Genealogicos a deduzir esta família,
fazendo o tronco dos deste appellido. Delle foy segundo Neto João Rodrigues de
Sá, conhecido pelo nome das Galés, Senhor de Sever, etc, .
Alcaide Mór do Porto, e Camareiro Mór de ElRey
D. João I, casou com Dona Isabel Pacheco, filha de Diogo Lopes Pacheco, Senhor
de Ferreira de Aves” ( Memorias Historicas e Genealogicas dos Grandes de
Portugal, Antonio Isidoro da Fonseca, M. DCC.XLII, páG. 42-3). Este Joáo
Rodrigues de Sá será o antepassado do “segundo João Rodrigues de Sá, como lhe
chama João de Barros, que casou com D. Joana de Albuquerque, pai dos
mencionados Garcia de Sá, Francisco de Sá e também de Brites de Albuquerque,
que casou com Lopo de Sousa, pais do já mencionado e celebre Martim Afonso de
Sousa ( António Caetano de Sousa, Serie dos Reys de Portugal,Ofiicina Sylviana,
M.DCC.XLIII, pág.147). Por isso, tudo leva a crer que Diogo de Sá também
entroncará naquele ramo e, por conseguinte, será parente daqueles célebres
capitães, que se notabilizaram no Oriente, tendo sido dois deles governadores
da Índia, embora, primeiro o sobrinho- Martim Afonso de Sousa - e, depois, o tio - Garcia de Sá. E mais não
sabemos, no que respeita às suas origens.
Diogo de Sá foi moço de câmara do rei
Venturoso. De onde se infere que, antes de embarcar para o Oriente, vivia na
corte. Onde deve ter convivido com Damião de Góis. Pois, este, em 1511, já lá
se encontrava e lá viveu durante dez anos. Nesses tempos ainda vivia na corte
Cataldo Sículo, que D. João II havia convidado para instruir o seu filho
bastardo D. Jorge. Por isso, faz todo o sentido pensar que Diogo de Sá também
foi instruído por aquele humanista, juntamente
com Damião de Góis e os demais
moços da corte. Entusiasmado com os relatos
que chegavam à corte, dos feitos de
Afonso de Albuquerque e empolgado com
as novas do embaixador
Mateus do Preste João, chegado em 1514, Diogo de Sá decide embarcar para a
Índia e, possivelmente, deve ter ido na armada que levava o sucessor do seu
herói e que largou do Tejo a 7 de Abril de 1515.
Como acima se deixou dito, a última
referência dos cronistas da Índia a Diogo de Sá situa-se no ano de 1526. É
possível que o ambiente de guerra entre facções, que se seguiu à morte do
governador D. Henrique de Menezes- 1524-1526-, o tenha desencorajado a
continuar do Oriente e tenha regressado ao reino.
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